segunda-feira, 25 de abril de 2011

O FABRICO DE SEIRAS NO JUNCAL


1. BREVES CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS

Juncal é sinónimo de junqueiro, local onde há junco. De facto, ainda hoje é possível encontrar no Juncal zonas onde o junco cresce espontaneamente, em grande quantidade. Apesar disso, só após 1948 é que o fabrico artesanal de produtos com junco surgiu no Juncal. Até essa data essa actividade estava localizada na Castanheira. Existem informações que mostram que também se produziam artefactos em junco pelo menos no Ribatejo e Alentejo. Pelo contrário, não existem dados seguros acerca da data nem do modo de início da produção na Castanheira.
Até 1943/44, apenas se faziam carpetes, passadeiras e esteiras para a praia. Nessa data veio para a Castanheira uma família de Lisboa (os “Manecas”), de propósito para ensinar os produtores locais a fazer SEIRAS.
Passadeiras
Em 1948/49 Rafael Henriques Sousa, que já era produtor na Castanheira, mudou-se para o Juncal. Veio com a família e arrendou um espaço para habitação e outro para produção de Seiras, na Rua da Fonte (onde é hoje a casa de Francisco Pinheiro). A esposa Florinda da Conceição e a irmã Francisca (“Sica”), começaram entretanto a ensinar a técnica de tecer a outras mulheres, que se mostravam interessadas, por exemplo a D. Hortense e a D. Celeste Borges.
Passadeiras
       Esta actividade tornou-se num complemento económico para as famílias. Muitas raparigas logo que saíam da escola, com 10 ou 12 anos, iam aprender a tecer nos teares dos empresários. À medida que se iam casando, construíam o seu próprio tear, que instalavam num anexo às suas casas, permitindo-lhes mais facilmente conjugarem as actividades do tear com a vida doméstica.
Rafael Henriques Sousa controlava todo o processo produtivo de Seiras e Esteiras em junco, no Juncal. Assegurava todo o processo produtivo, desde a colheita do junco até à entrega do produto final, nunca vendendo à peça; comprava junco, em grandes quantidades, nos arredores de Santarém, onde chegou a ter pessoal dedicado exclusivamente à colheita de junco para a sua empresa; comprava as tintas de que necessitava em grandes quantidades, em armazenistas do Porto e também revendia, na região, e adquiria o fio de juta em grandes quantidades, na Fábrica de Torres Novas. Além disso, ainda, controlava as vendas, sem intermediários (quando necessário deslocava-se a outras regiões do país para fazer entregas de produtos).
Chegaram a existir, no Juncal, vários empresários. Rafael Tomás Morgado, mais conhecido por “sacristão”, dedicou-se a este negócio nos anos 50 e 60. Francisco Marcelino, durante os anos 60, só vendia à peça (malas e cantos, ainda por coser), Conceição Simões e Iria Machado desenvolveram esta actividade nos anos 80. Nos anos 90 assistiu-se à decadência da produção. O último empresário a produzir seiras foi Belmiro da Conceição Sousa, o qual encerrou a sua actividade cerca do ano 2000.



2. PROCESSO PRODUTIVO

Enumeram-se de seguida, as várias fases que eram necessário encadear até chegar ao produto final, a Seira:
 
•APANHAR O JUNCO           
•SECAR O JUNCO
•ATAR E CORTAR O JUNCO
•LAVAR O JUNCO
•COLOCAR NO POTE
•TINGIR O JUNCO
•URDIR O TEAR
•SAFIAR O TEAR
•TECER
•CORTAR O TEAR
•ATAR AS MALAS E OS CANTOS
•CORTAR AS PONTAS
•APARCEIRAR AS MALAS COM OS CANTOS
•COSER AS MALAS  AOS CANTOS
•COLOCAR AS ASAS


3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

           
O processo produtivo de artefactos em junco é excessivamente dispendioso, longo e exclusivamente manual. Enquanto objecto utilitário, a Seira foi substituída por produtos incomparavelmente mais baratos (sacos de plástico, por exemplo). Em 2010 a empresa “Pingo Doce Distribuição Alimentar, S.A.” modificou os seus sacos recicláveis, imprimindo excelentes fotos de seiras no seu exterior, criando a ideia de se estar em presença de verdadeiras seiras (e com um preço muitíssimo mais baixo).
Agora que a produção de seiras quase acabou, é curioso ver persistir a sua estética num contexto sócio-económico, cultural e tecnológico inteiramente diferente. Esta persistência surge como um verdadeiro desafio. Desperta-nos para a pergunta: que futuro para os produtos em junco, em especial as SEIRAS?
       A sobrevivência destes produtos poderá passar pela sua recriação e reposicionamento no mercado.

Autores do texto e fotografias:
Dr. Carlos Mendonça
Senhora Célia Gomes

Sem comentários:

Enviar um comentário